O Governo do Uruguai rompe seu contrato com o estaleiro Cardama por 80 milhões e avisa de possível “fraude”
O presidente Yamandú Orsi rescinde o acordo para a compra de dois navios a Cardama, assinado pela administração anterior, após detectar supostas irregularidades nas garantias do acordo. O estaleiro espera chegar a um acordo pois "não faz sentido que o contrato se rompa"

Polémica no Uruguai pelo contrato com o estaleiro galego Cardama para a construção de dois navios de patrulha oceânica. O Governo de Yamandú Orsi anunciou esta quarta-feira que irá rescindir o contrato de quase 90 milhões de euros assinado em 2023 pela administração anterior com a companhia com base operacional em Vigo após detectar alegadas irregularidades nas garantias do acordo.
Numa coletiva de imprensa, o presidente do país indicou que existem indícios “de uma fraude ou estelionato contra o Estado uruguaio” e informou que ordenou o início de ações judiciais tanto civis como penais, assim como o exercício da denominada garantia “de fiel cumprimento” do acordo antes de seu vencimento.
O Governo uruguaio firmou um contrato com Cardama em 2023 durante o Governo de Luis Lacalle Pou por 92 milhões de dólares. Este deveria ser renovado, mas Orsi, conforme explicam os meios locais, tomou a decisão de rescindir no mesmo dia em que a garantia de cumprimento vencia.
Problemas com as garantias
Segundo os meios uruguaios, o contrato exigia que Cardama apresentasse uma garantia de cumprimento equivalente a 5% do custo total do contrato num prazo de 45 dias. No entanto, segundo garantiram desde o Governo uruguaio, a empresa não o fez e solicitou sucessivos adiamentos, prolongando esse prazo de 45 dias para 11 meses. O subsecretário de Defesa, Jorge Díaz, assegurou que a empresa iniciou até sete vezes o processo de validação.
Ao vencer-se o prazo contratual, segundo o relato dos governantes uruguaios, Cardama teria apresentado uma garantia emitida por uma firma britânica chamada Eurocommerce Limited, que foi aceita apesar de não cumprir o estabelecido no contrato.
Empresa no Reino Unido
«Perante a iminência do vencimento do prazo, porque no dia 22 de setembro Cardama deveria nos informar qual era a nova garantia, o presidente da República resolveu iniciar o processo de execução da garantia e deu instruções ao embaixador no Reino Unido para que se dirigisse aos escritórios da empresa Eurocomerce Ltda. no Reino Unido para notificar de forma formal a empresa que depositasse o dinheiro da garantia numa conta em nome do Estado uruguaio», explicaram.
Não obstante, o subsecretário indicou nessa coletiva de imprensa que a empresa não operava no endereço mencionado e que se encomendou um relatório jurídico que determinou que Eurocommerce estava “em processo de liquidação”. “Há indícios fortes de que esta empresa é uma empresa de fachada e que estaríamos perante uma fraude ao Estado uruguaio pois esta garantia não existiria”, expôs.
Fala Cardama
Sobre este ponto, fontes de Cardama indicam que falaram com o mencionado banco e que este lhes confirmou que mudou seu endereço no Reino Unido.
“Em todos estes tipos de contratos, as garantias são apresentadas, são dadas para descumprimentos de contrato. Nós não temos absolutamente nenhuma comunicação de descumprimento de contrato. Ninguém nos comunicou descumprimentos de contrato, ninguém. Estamos muito surpresos porque nos inteiramos pela imprensa”, relataram à Europa Press fontes do estaleiro de Vigo.
Além disso, explicam que uma delegação da empresa galega esteve reunida há algumas semanas com a ministra da Defesa do Uruguai, Sandra Lazo, e que ninguém da administração do país comunicou “nem por escrito nem verbalmente” que Cardama estivesse descumprindo o contrato.
Neste contexto, a intenção de Cardama é sentar-se a negociar com o Governo do Uruguai porque, em sua opinião, “não faz nenhum sentido que o contrato seja rompido”. “Outra coisa é que haja outros interesses que desconhecemos”, apontaram as fontes consultadas.
Caso finalmente se rescinda o contrato, Cardama deveria devolver ao Governo uruguaio, segundo relatam as fontes da empresa, cerca de 8 milhões de euros em conceito de garantias.
A isso soma-se que teria que se dirimir nos tribunais o que ocorreria com os 28 milhões de euros que já foram pagos pelo Executivo sud-americano para a construção das patrulheiras.
A construtora naval galega considera que a anulação do contrato representaria um golpe para a empresa, mas também para o Uruguai, que, segundo Cardama, precisa das embarcações “como água de maio” para resolver os “gravíssimos” problemas de pesca ilegal e de narcotráfico nas suas costas.